quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Uma noite de estrelas portuguesas no Vila Joya


A noite estava fresca. Vesti o casaco de malha e parei para ouvir ao longe o barulho das ondas a fustigar a areia. Inspirei fundo e senti-me feliz. Era a primeira vez que estava num dos mais prestigiados restaurantes portugueses, detentor de duas estrelas Michelin. Mas não era só isso que me fez sorrir e sentir como se houvesse um mundo mágico e eu tivesse a sorte de fazer parte dele. A noite em que fui jantar ao Vila Joya (duas estrelas Michelin), no âmbito do International Gourmet Festival, foi a noite dedicada aos chefs e restaurantes premiados pelo famoso guia Michelin em Portugal.

Antes do jantar, teve lugar a apresentação do azeite da primeira colheita de 2013/2014 da Oliveira da Serra, a que agradeço desde já, a minha ida a tão prestigiado festival, incluindo o respectivo transporte. Para esta apresentação o chef Matteo Ferrantino preparou grissinos e uma focaccia que ensopada no azeite, soube muito bem. Do azeite virgem extra Oliveira da Serra apresentado, a primeira coisa que me chamou a atenção foi a cor. Um verde intenso, dourado. Quando provei, sobressaiu um aroma frutado com um final de boca ligeiramente picante. Muito bom. Tivemos ainda a possibilidade de experimentar uns bolinhos de azeite, feitos pelo chef Vitor Sobral, preparados com esta primeira colheita. Para finalizar a apresentação foi servido gin com uma esferificação em que o azeite marcava presença.


Já sentados à mesa, sabia que a noite ia ser longa, no menu, contei onze pratos. E como num baile, a dança começou e as entradas vieram aos pares, o que de certa maneira, acelerou o ritmo do serviço, que neste tipo de jantares acaba inevitavelmente por se prolongar noite dentro. Ostra Gillardeau, ponzu e tangerina da Madeira, com uns mini pepinos que nunca tinha visto, por Benôit Sinthon, do restaurante madeirense Il Gallo d'Oro (uma estrela Michelin), abriram-nos o apetite, servida com um vinho Quinta de Camarate branco doce fez-nos sonhar com o mar azul em dias de céu limpo. Polvo, limão e batata decorados com folha de ostra, um prato bonito, do chef luso descendente, George Mendes, foi a segunda entrada. Confesso que tinha imensa curiosidade no trabalho deste chef, que conquistou uma estrela Michelin com o seu Aldea em Nova Iorque. Às vezes colocamos as expectativas tão altas, que quando chega ao momento achamos que afinal faltou qualquer coisa. A acompanhar o polvo, um vinho Cortes de Cima Sauvignon Blanc de 2012.


A segunda dupla de entradas foi atum toro envolvido num crocante de quinoa, com beringela e miso, do talentoso chef Hans Neuner do restaurante Ocean (duas estrelas Michelin), e salmão escocês marinado com caviar imperial do chef Henrique Leis, do restaurante Henrique Leis (uma estrela Michelin). Fiquei rendida ao salmão e ao trabalho deste chef. Ambas as entradas foram acompanhadas por um vinho branco Herdade da Calada Baron de B Reserva 2012.


A abrir os pratos principais, foi a vez do chef Ricardo Costa do restaurante The Yetman (uma estrela Michelin) que nos presenteou com salmonete, vieira, lulas e carpaccio de cozido. Que maravilha. O molho com um toque de champanhe, reforçou a grandiosidade deste prato. Acompanhámos o salmonete com champanhe Dom Pérignon.


Mas para mim, um dos melhores pratos da noite foi o do chef Vincent Farges, do restaurante do Hotel da Fortaleza do Guincho (uma estrela Michelin), pregado selvagem servido num caldo de vitela e champanhe com alcachofras de Jerusalém, avelã e trufa de Alba. Uma brisa de Atlântico vinda do Guincho inundou de sorrisos satisfeitos cada garfada deste prato. A acompanhar, um vinho Pelada de 2003.


O chef Albano Estrela, do restaurante Arcadas em Coimbra, também brilhou nesta noite de estrelas. Fez-nos chegar à mesa um cappuccino de trufas pretas e Sot l'Y Laisse (pedaço de frango do dorso) que nos surpreendeu a cada colherada. Um dos pratos que conseguiu captar os tons românticos de Outono como se de um poema se tratasse, foi o chef Leonel Pereira do restaurante São Gabriel. Fez-nos chegar foie gras cozido em vinho tinto, marmelada de açafrão, cebola caramelizada e couve-flor em diferentes texturas. A mim, fez-me lembrar um passeio pelo campo ao pôr do sol num dia de Outono, em que as parras das videiras se enchem de tons amarelos dourados e grenás. Um prato poema, que provamos e queremos voltar a repetir.

( Fotografia da direita da autoria de Vasco Célio )

Trocando a ordem inicial do menu, os anfitriões da noite, Dieter Koschina e Matteo Ferrantino, confeccionaram sela de corça, uma carne terna e suculenta - que foi a primeira vez que comi - servida com três texturas de salsify, foie gras fresco e azeite esferificado. Um prato digno de deuses. Terminámos os pratos de carne com lebre, fígado de ganso, feijão branco e cogumelos do conhecido chef José Avillez do restaurante Belcanto (uma estrela Michelin) que nos tem surpreendido com várias criações pautadas sempre pela criatividade e inovação. O prato de lebre estava decorado com uma folha de massa tenra em forma de plátano a lembrar uma filhós, numa alusão ao Outono. Exageradamente, a folha enchia o prato. O sabor da lebre estava demasiado apurado para o meu gosto. A acompanhar as carnes um vinho Batuta de 2010.

( Fotografia da esquerda da autoria de Vasco Célio )

A sobremesa veio pela mão do talentoso chef Vitor Matos que nos apresentou uma variação de grandes crus com frutos silvestres e violetas, servido numa original garrafa de vinho do Porto espalmada a fazer de prato. Uma sobremesa colorida, fresca mas que, na minha opinião, não reflecte o brilhante trabalho que já tive a possibilidade de degustar no restaurante Largo do Paço (uma estrela Michelin) na Casa da Calçada em Amarante. A acompanhar a sobremesa, um Porto Pintas Vintage 2007.

( Fotografia da autoria de Vasco Célio )

Antes dos mignardises e do café, foi-nos servido um batido de rúcula e azeite Oliveira da Serra, geladinho, soube mesmo bem.

Este jantar no Vila Joya foi uma festa de estrelas, em que os nossos mais conceituados chefs brilharam, cada um à sua maneira. Um jantar a doze mãos não é uma tarefa fácil, mas Dieter Koschina e os restantes convidados mostraram que merecem muitas estrelas e tornaram esta noite inesquecível e especial. E especial é também este International Gourmet Festival, que desde 2006, tem vindo a promover a alta cozinha.


Outros olhares sobre este jantar:
- Noite portuguesa, noite feliz por Duarte Calvão;
- International Gourmet Festival: A gloriosa noite dos 12 magníficos por Paulo Brilhante.

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