Tenho um especial carinho pela cozinha alentejana. Nascida e criada no Ribatejo, confesso que olho com profunda admiração e curiosidade para a cozinha do além Tejo. O uso das ervas - poejo, coentros e hortelã da ribeira - tornam a simplicidade de alguns pratos numa refeição memorável. E quando digo simplicidade, refiro-me apenas aos ingredientes utilizados como o pão, azeite e alhos. Uma trilogia de sabores que foi passando de geração em geração para nosso grande prazer gastronómico. E como então, juntar o pão, o azeite e os alhos num prato memorável?
Os alentejanos fazem-no, principalmente, na açorda e nas migas. E para perceber como são feitos estes pratos, ontem, fui até à BTL para assistir à demonstração culinária, Degustação do Caminho das Oliveiras Milenares, do chef Narciso Peraltinha do restaurante Feitiço da Moura do hotel rural Horta da Moura, em Monsaraz.
O hotel rural tem no seu espaço oliveiras milenares e tradição na produção de azeite. Por isso, uma das primeiras degustações que o chef nos proporcionou foi uma prova de azeite com flor-de-sal e folhas de alecrim. Tão curioso o modo como a flor-de-sal ajuda o azeite a abrir os sabores. No final de boca, um ligeiro aroma perfumado a alecrim, convida-nos a voltar a molhar generosamente o pão no azeite. Nestas situações já me rendi, não digo que não às vontades do meu palato.
Enquanto provávamos o azeite, o chef colocou ao lume dois tachos. Um com leite e uma posta de bacalhau e outro com água, uma posta de bacalhau, dois dentes de alho com camisa, um ramo de coentros, poejo e um gole de azeite. Tirou a côdea a umas fatias de pão alentejano e cortou-o posteriormente em cubos. O primeiro prato que confeccionou foi a açorda. A açorda alentejana consiste num caldo aromático e rico em sabores. Para a açorda começou por preparar o piso. Numa taça colocou quatro dentes de alho, umas folhas de poejo, uma tira de pimento verde cortado, um ramo de coentros e sal grosso. De seguida esmagou a mistura com a ajuda de um pilão. Adicionou um ovo que desfez com um garfo. Regou a mistura com a água quente de cozer o bacalhau e mexeu. Serviu a açorda com fatias de pão alentejano, de preferência do dia anterior. Pode-se guarnecer a açorda com um ovo escalfado ou até bacalhau.
De seguida ensinou-nos a preparar migas de poejo e coentros e migas gatas. As migas de bacalhau no Alentejo designam-se por "gatas". Para as migas colocou numa frigideira dois dentes de alho picados, dois dentes de alho esmagados e poejo. Deixou refogar um pouco e adicionou um ramo de coentros picados e o pão cortado em cubos. Mexeu, de modo a que o pão absorvesse um pouco do azeite. Acrescentou a água de cozer o bacalhau e desfez com uma colher de pau o pão. Depois, colocou o lume no mínimo e moldou as migas. Deixou secar, virando-as de vez em quando para irem ganhando uma crosta deliciosa.
Para as migas gatas levou uma frigideira ao lume com alhos, coentros, uma tira fina de pimento verde, poejos e hortelã da ribeira, tudo picado. Adicionou azeite e levou ao lume a frigir um pouco. De seguida adicionou o bacalhau cozido em leite, previamente lascado. Com uma colher de pau desfez um pouco o bacalhau. Refrescou o preparado com uns borrifos de vinho branco e adicionou fatias de pão, com a côdea, cortadas em cubos. Voltou a adicionar mais um pouco de azeite e regou com o leite resultante da cozedura do bacalhau. Temperou com sal e adicionou um ovo, mexeu. Deixou as migas secarem um pouco e serviu.
Para mim, ainda tenho tanto para descobrir na nossa cozinha regional. O chef Narciso Peraltinha vai repetir esta demonstração no dia 14 de Março, sexta-feira, às 11h no espaço do hotel rural Horta da Moura na BTL, em Lisboa. Se quiserem, façam-lhe uma visita e provem estas iguarias da cozinha alentejana.
18 comentários :
Eu ando traumatizada com receita com pão, em particular com migas. Mas vou fazer!
Uma bela sugestão.
Sendo eu Alentejana adoro migas e açordas Isabel. Adorei por isso este teu post (como sempre)
beijinhos!
Bela partilha!! Eu não sou Alentejana mas também gosto muito de migas...
O meu nome é Vanda e tenho raízes alentejanas. As migas e as açordas há muito que conquistaram o seu lugar na minha mesa. Fiquei muito satisfeita com esta sua divulgação. Admiro o entusiasmo e o carinho que transmite quando o tema é a gastronomia. Obrigada!
Sou eborense e conheço bem Monsaraz e a Horta da Moura. Açorda e migas são pratos frequentes em minha casa, principlamente durante os fins-de-semana que é quando estamos todos reunidos. Cresci com estes pratos (e mais alguns bem tipicos do Alentejo) e sou grande apreciadora dos mesmos, ou não fosse eu alentejana :)
Na minha terra as migas de bacalhau chamam-se masmárrias e só levam azeite, alho, bacalhau e poejo e um ovo mexido.E depois temos as outras migas, que podem ser só com o azeite e alho ou acompanhadas com entrecosto frito de porco preto ( já mais moderno )
Sou Alentejana. Adoro estes pratos e nunca faço porque o namorido não aprecia!
Que saudades!
Eu sou brasileira, mas a d o r o açorda!!!!
Masterchef cá de casa,
eu adoro migas. São tão boas!
Um beijinho.
Tertúlia da Susy,
muito obrigada.
Um beijinho.
Querida Mariana,
muito obrigada.
A cozinha alentejana é sempre uma boa surpresa.
Um beijinho.
Pimentinha,
eu também adoro. Cá em casa um destes dias tenho que experimentar as migas de batata, que também me dizem que são muito boas.
Um beijinho.
Iguaria Desigual,
muito obrigada pelas suas palavras.
Um beijinho.
Maria,
fiquei com vontade de descobrir mais da cozinha alentejana. Durante a demonstração também me falaram das migas de batatas e de couve-flor. Fiquei curiosa. Um destes dias ainda experimento.
Um beijinho.
Olá,
que curioso. Masmárrias, não fazia ideia. Obrigada.
Um beijinho.
Selene,
a comida alentejana é tão boa. Confesso que depois desta apresentação fiquei ainda com mais vontade de descobrir a nossa gastronomia regional.
Um beijinho.
Mariliafig,
açorda é um prato cheio de sabor e tão simples.
Um beijinho.
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